Sunday, April 25, 2010

HIDRÁULICA

Grupo 02

Autor: Adilson dos Santos Miranda

Revisores: Eric R.M., Luciano Fonseca e Villi Seilert


Desde tempos imemoriais, a água tem para o homem uma importância capital, seja para sua existência, seja para manutenção da vida. Além de sua relevância biológica, também se destaca seu valor social e econômico. O uso da água como recurso energético remonta aos primórdios do primeiro milênio, sendo que esse recurso passou a ser usado na geração de eletricidade no final do século XIX após a descoberta dessa. (REIS, 2003). Por fim, para entendermos um pouco mais o estado da arte da energia hidráulica no mundo e, sobretudo, no Brasil, faremos uma breve visita aos aspectos técnico-econômicos, sociais e ambientais.


Aspectos técnico-econômicos


O uso da energia hidráulica como meio para a geração de eletricidade só é possível porque a energia gravitacional potencial é transformada em energia cinética que, por sua vez, transforma energia mecânica em energia elétrica (REIS, 2003). Além disso, para que essa transformação seja possível em grande escala, faz-se necessário construção de barragens para a capitação da água dos rios e da chuva. Nesse sentido, para geração de energia elétrica, dois elementos são decisivos: o índice pluviométrico da região e a topografia (ATLAS).

Segundo dados na ONU, a quantidade de recursos hidráulicos teoricamente aproveitáveis para a geração de energia elétrica no mundo está na ordem de 10.000 a 20.000 TWh/ano (ATLAS), sendo que esse potencial tem uma relação direta com a quantidade de precipitação de chuva. Ademais, 65% desse percentual estão concentrados em apenas 10 países, o Brasil ocupar a terceira posição, ficando atrás de China e Estados Unidos respectivamente. No caso do Brasil, seu potencial está entre 501 e 2000 TWh/ano. No mundo, a energia elétrica gerada pela energia hidráulica corresponde a 19% do total, sendo que no Brasil ela corresponde a 70% (MATRIZ).

Quanto à possibilidade de transformação desse potencial hidráulico em energia elétrica, o Brasil teria um potencial hidrelétrico em torno de 260,1 TW, sendo que a capacidade instalada está por volta de 74.000 MW, não representando mais do que 28,4% de nosso potencial. Nesse sentido, temos um potencial não aproveitado (estimado e inventariado) em torno de 186.000 MW, dos quais apenas 68% foram inventariados. Há de se destacar que boa parte desse potencial se concentra na região amazônica com 50,2% e nas bacias dos rios Paraná e Uruguai com 29%. No entanto, a expansão da produção de energia nesses locais se esbarra em problemas de ordem distintas, neste o problema diz respeito à densidade populacional das áreas rurais; naquela se referem às questões ambientais (manutenção da biodiversidade) e às questões sociais (terras indígenas) (BERMANN, 2007). O restante desse total está no potencial estimado (feito em escritório), a saber, é a soma dos potenciais remanesceste e individualizado (ATLAS). Vejamos a divisão desse potencial para cada região brasileira (MATRIZ):
















Fonte: PDEE (2006-2015), MME/EPE (2006, SIPOT. Eletrobrás (2005).


Como podemos observar, está nas regiões Sul, Sudeste e Nordeste a maior boa parte do parque gerador brasileiro, sendo que nas regiões Centro-Oeste e Norte se concentram a maior parte do potencial não aproveitado. Nesse sentido, a expansão do parque gerador brasileiro se iniciou em 1950 a partir da região Sudeste e foi se irradiando para outras regiões, ditado pelo ritmo do crescimento econômico brasileiro. Esse quadro aponta que de acordo com as necessidades enérgicas brasileiras, haverá uma forte tendência para expandir da produção de energia para região centro-norte (MATRIZ).

Segundo a Matriz, em 2030 mesmo havendo a utilização de quase todos os recursos hidrelétricos potenciais, algo em torno de 120 mil MW, não haverá energia elétrica o suficiente para atender a demanda, isto é, um aumento do consumo entre 950 e 1.250 TWh/ano, isto sinaliza que essa fonte se esgotará e que o país indubitavelmente recorrerá a outras fontes enérgicas para na geração de energia elétrica. O sentido desejável dessa expansão se daria inicialmente do potencial inventariado ao potencial estimado e do potencial das regiões sudeste-sul e somente depois ao potencial das regiões centro-norte, sendo que Amazônia se tornaria a última fronteira de exploração, a última alternativa. Todavia, o leilão de Belo Monte pode significar que as prioridades são relativas e que essa agenda pode ser alterada de acordo com os interesses em jogo.

A expansão apontada acima está atrelada ao crescimento da economia, pois existe uma relação direta entre o consumo de energia e o crescimento econômico, isto é, este determinará aquele. Assim se o crescimento do PIB for alto, haverá um incremento na demanda de energia. Em vista disso, o documento a Matriz 2030, estabelece alguns cenários os quais de acordo com o crescimento do PIB, haverá crescimento da demanda de energia. Esses cenários refletem como as condições macroeconômicas do mundo atingiram o Brasil e cobrem o período de 2005 a 2030, determinando qual seria a taxa média de crescimento do PIB para cada um deles. No caso, são vislumbrados três cenários: “A”, “B” subdividido em B1 e B2 e “C”. O cenário “A”, o melhor, caracteriza um mundo globalizado (Mundo uno) e o Brasil se aproveitando do bom momento, o qual a taxa média de crescimento do país ficaria em torno de 5,1%; o cenário “B”, o intermediário, caracteriza por um mundo dividido em blocos econômicos (Arquipélago), sendo que no cenário B1, o Brasil cresceria em média 4,1% e no B2, 3,2%; o cenário “C”, o pior, caracterizado por mundo isolamento e protecionista (Ilha), cresceríamos em média 2,2%. Desse modo, é a configuração de um desses cenários que determinará o incremento ou não do nosso parque gerador elétrico brasileiro.

Por outro lado, Bermann (2007) sugere a partir de outros autores que a política enérgica brasileira caminha lado a lado com o lucro de agente privados, sendo que os projetos de construção de barragem são pautados pela lógica do mercado, não levando em conta os aspectos ambientais e sociais em sua estação. Um exemplo disso foi a construção de Tucuruí, pois os investidores alegaram que não seria viável a exportação de alumínio pelo custo que a energia elétrica representaria ao preço final, contudo que o Estado subsidiou a produção desse minério, reduzindo o preço da energia elétrica. Ou seja, Tucuruí foi construída para atender essa indústria e não a sociedade como um todo. A decisão de fazer do Brasil um exportador de produtos eletrointensivos fez parte dos planos de desenvolvimento dos governos militares (VAINER, 2007), algo que não está muito distante da realidade presente, haja vista que entre as empresas do grupo que arrematou Belo Monte, há empresa do ramo da mineração.



Aspectos sociais e ambientais

Como todo lado tem seu verso, o verso do uso do potencial hidráulico brasileiro são as questões sociais e ambientais que, como parece, seus custos não são externalizados. Segundo Bermann, até o ano de 2007, 200 mil famílias foram expulsas ou deslocadas das áreas inundadas para a formação dos reservatórios, isso corresponde a uma área de 34. 000 km². Em outras palavras, essas pessoas são expulsas de suas áreas sem a devida indenização, quando recebem, uma vez que não é possível reproduzir seu modo de vida, perdendo para sempre cultura, memória e identidade construídos no local em nome de um chamado ‘desenvolvimento’. Assim, além dos problemas sociais causados, há um grande prejuízo ao meio ambiente como: “alteração do regime hidrológico”, “comprometimento da qualidade da água”, “assoreamento dos reservatórios”, “emissão de gases de efeito estufas”, “problemas de saúde pública”, “dificuldades de assegurar o uso múltiplo das águas” entre outros (BERMANN, 2007).

Portanto, para se fazer uso ‘racional’ de nosso potencial hidráulico, os aspectos sociais e ambientais devem ter o mesmo peso para a construção ou não de um reservatório, pois transformar grandes áreas de nossos territórios em “jazidas energéticas” para a exportação de energia elétrica embutida em produtos e o favorecimento de alguns, não justifica os prejuízos às populações ribeirinhas e ao meio ambiente, já que esses são geralmente irreparáveis.


Conclusão


Segundo o Ministério das Minas e Energia (2010), a entrada de Belo Monte em operação vai significar 4.571 MW médios de energia elétrica acrescentado ao Brasil, sendo que sua capacidade instalada será de 11.233 MW atingidos somente no período de chuvas. Portanto, o Brasil só poderá conta de fato com 4.571 MW, o que não justificaria um projeto de tamanha envergadura, pois apenas com a “repotenciação das usinas” em operação, poder-se-ia aumentar a capacidade de geração de energia em 12%, ou seja, fazendo a repotenciação pesada, ter-se-ia 8.093 MW a nossa disposição sem a construção de uma única usina. Além dessa possibilidade, a “complementação da motorizarão”, acrescentaria ao sistema elétrico algo em torno de 4,4 MW (BERMANN, 2007), também sem a inundação de um único km². A soma dessas duas possibilidades superaria o potencial instalado de Belo Monte a um custo bem menor em todos os sentidos.

Devemos estar atentos para o plexo de interesses envolvidos na questão de produção de energia elétrica no Brasil, pois muitas das vezes se alega o interesse público como justificativa, mas o fim da geração da energia acaba não sendo a sociedade.


Referências


BRASIL. Ministério das Minas e Energia. Usina de Belo Monte é licitada com deságio de 6%. Disponível em <http://www.mme.gov.br/mme/noticias/destaque_foto/destaque_0082.html>. Acessado em: 25 de abril de 2010

BRASIL. Agência Nacional de Energia Elétrica. Atlas de energia elétrica do Brasil.

Brasília: Aneel, 2008.

BRASIL. Ministério de Minas e Energia. Matriz Energética Nacional 2030 / Ministério de Minas Energia; colaboração Empresa de Pesquisa Energética. _ Brasília: MME: EPE, 2007.

BERMANN, C.. Impasses e controvérsias da hidreletricidade. Estud. av. [online]. 2007, vol.21, n.59, pp. 139-153. ISSN 0103-4014.

REIS, L. B.; FADIGAS, E. A. A.; CARVALHO, C. E.. Energia, Recursos Naturais e a Prática do Desenvolvimento Sustentável. Monole. São Paulo, 2005.

VAINER, C. B.. Recursos hidráulicos: questões sociais e ambientais. Estud. av. [online]. 2007, vol.21, n.59, pp. 119-137. ISSN 0103-4014.

12 comments:

Adilson said...

Olá pessoal,

Houve algum problema na postagem do texto que eu não consegui detectar e arrumar, contudo acredito que isso não terá influência alguma em sua leitura.

WJr. said...

Algum valor monetário paga o "alagamento" da cultura, estabelecida durante algum tempo, de uma pequena comunidade? E o valor sentimental que essas comunidades têm com seus terrenos. Exemplo: locais que são passados de "pai para filho" - história da família. Há indenização ao sentimento?

É interessante, nos colocarmos no lugar dessas comunidades - refugiadas da barragem. É uma simulação curiosa. Eu por exemplo, iria resistir se alguém chegasse na minha casa falando que eu teria que ir embora, pois ali, seria construída uma barragem. - "Como assim, construir uma barragem no lugar da minha casa, a casa que os meus avós cresceram e que os meus netos estão crescendo".

Esses e outros questionamentos deveriam ser levados em consideração nas pautas dos planejadores energéticos.

Debora said...

Bem, após esta descrição e viagem pelo tempo sobre o uso da água para a geração de energia elétrica, e ao finalizar o texto é feita a refência ao Complexo de Belo Monte, eu deixo a seguinte pergunta ao grupo: como fica a relação custo X benefício para a construção desta nova barragem, se vários pontos de vista, como ambiental, social já foram vistos que não valem a construção deste empreendimento?

Cilma Azevedo said...

Sempre voltamos ao mesmo ponto: a supervalorização do aspecto econômico em relação às questões ambientais e sociais. É impressionante o quanto a nossa política foca nos interesses “pessoais” e não públicos. Quando teremos uma política energética, madura, solida, que defenda os interesses do nosso país sustentavelmente? Porque temos que construir novas hidrelétricas e deixar as existentes com a operação limitada ou com tecnologia desatualizada?!!!!

José Carlos said...

Realmente, esta é uma questão complicada e delicada em se discutir. É fato que o consumo de energia irá crescer ano após ano e que chegará a um ponto que mesmo com a “repotenciação das usinas” e com a “complementação da motorizarão”, haverá a necessidade de buscar outras fontes de energia. A UHE de Belo Monte não será a primeira e nem a última usina hidrelétrica que gerará tanta discussão e polêmica como vemos nestes dias. O que realmente não encaixa é a política energética brasileira caminhar de mãos juntas com os agentes privados. Na verdade, as populações diretamente e indiretamente afetadas pela construção de usinas não estão sendo sacrificadas por um bem maior, neste caso a população brasileira, mas sim pelos agentes privados. E isso é algo que não pode acontecer...

Nanci Ambiental said...

O crescimento do PIB esta diretamente atrelado com o aumento do consumo de energia elétrica, como demostra o texto. Os cenários previstos para o crescimento monstram o favorecimento da matriz energética para o setor privado, deixando-se o social e o ambiental de lado. Essa tendência tem um viés perigoso para as sociedades que vivem diretamente toda esta problemática social, ambiental, econômica e cultural. Nosso modelo energético tende a desenvolver matrizes relacionadas a energia provinda de hidrelétricas, pois a geopolítica nos favorece a este aspecto. Assim as tomadas de decisão, relacionados aos diferentes setores defendidos ou não, deverão ser contemplados, senão, não teremos a "Real Democracia", mas sim, políticas tendenciosas e cada vez menos representadas pela sociedade, e mais representadas pelo topo da pirâmide de classes.

Alano Nogueira said...

teste

Marcelo Wolter said...

Bom, de um lado temos os movimentos ambientais e sociais, de outro lado a máquina do governo e das empresas privadas. Essa briga vai continuar existindo por milhares de anos. É certo que os tomadores de decisão são movidos à dinheiro, porém temos que lembrar que toda e qualquer obra gera impacto (ambiental ou social). É essencial reponteciar as usinas e complementar a motorização, porém um dia será necessária a construção de uma nova usina e toda essa discussão viria a tona novamente.

Eric said...

De fato a construção da usina de Belo Monte traz poucos benefícios para o povo brasileiro e muitos malefícios para o meio ambiente ao seu redor, demonstrando ser um projeto de interesse apenas econômico.

Brasil said...

Como informado no texto postado pelo colega Adilson (Hidráulica), no Brasil, a capacidade instalada de energia elétrica proveniente de energia hidráulica é de apenas de 74.000 MW, não representando mais do que 28,4% de nosso potencial. Muito pouco comparado com o nosso potencial disponível.
Apesar dos aspectos negativos (A construção de barragens para geração de energia costuma causar grandes impactos ao meio ambiente tais como deslocamento de populações; inundações de grandes áreas; destruição de patrimônios históricos e belezas naturais; grande taxa de evaporação de água; impactos climáticos locais e eventual carência de água no curso do rio, a jusante) mesmo assim, a implantação de usinas hidrelétricas deveria ser mais investida principalmente pelo fato de que dispomos muito em nosso país desse potencial energético ainda pouco explorado. Evidentemente que o aspecto da sustentabilidade, o aspecto social e o impacto ao meio ambiente devem ser ponderados antes da finalização e implantação de um projeto de usina hidrelétrica.
Apesar do Brasil possuir grande potencial hidrelétrico não explorado, o governo tem priorizado de forma errônea a utilização de termelétricas a gás (essas responsáveis por grandes emissões de CO2) e usinas nucleares (altíssimo custo de implantação, alto risco de acidentes e sérios problemas com os rejeitos), para atender ao nosso crescimento da demanda de energia.
O importante é ir na linha de pensamento de buscar cada vez mais outros tipos de energias alternativas mas, acima de tudo, de modo sustentável de modo a não agredir, ou agredir menos, o meio ambiente.

Andréa Bartonelli said...

Existe sobre esta questão uma enorme cortina de fumaça que desvia nosso olhar do que há de mais importante na discussão: DESENVOLVIMENTO É INTIMAMENTE DEPENDENTE DE ENERGIA. A energia hidráulica não só é uma das mais limpas como é a mais barata que existe; como já é a principal fonte da matriz energética brasileira, com enorme potencial de ampliação, passamos a ter uma vantagem competitiva que, para os “outros”, precisa ser diminuída ou eliminada com a instalação de usinas termoelétricas como fez FHC, que, além de muito mais caro o MWh, é extremamente poluidor e retira de nós essa imensa vantagem comparativa. Logo, a quem interessa então essa imensa cortina de fumaça? Qualquer forma de geração de energia tem um preço a ser pago. A quem interessa que paguemos o mais caro? Quem se beneficiaria de nossa ingenuidade?

Ivan Freitas said...

O potencial hidrelétrico brasileiro deve ser explorado de forma racional, visando minimizar os impactos das obras e empreendimentos.
Os custos de indenização dos impactos ambientais das UHE ainda não são claros e o processo de licenciamento ambiental sofre pressões do governo federal.